Dunga não quer saber de psicologia na seleção brasileira. Foi o que o treinador deixou bem claro nesta segunda-feira, durante uma mesa redonda com o técnico da seleção italiana, Antonio Conte, e o treinador do Fluminense, Levir Culpi. O debate fez parte do evento "Somos Futebol", organizado pela CBF ao longo desta semana.
- O jogador chega na seleção depois de uma viagem de 11 horas, tem poucos dias até o jogo. Ele vai abrir o coração dele (para um psicólogo) em meia hora? (...) Eu vou ver o psicólogo e vou perguntar: "Quem é esse cara? Será que ele vai contar para o dirigente? Será que ele vai contar para o treinador?". Desculpa meu modo sincero de falar, mas eu sou autêntico. Tem coisas inviáveis na seleção brasileira.
O artigo 9 do Código de Ética da categoria, elaborado pelo Conselho Federal de Psicologia diz:
- É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional.
Dunga disse ainda que, em geral, o jogador brasileiro assume cedo a responsabilidade de sustentar sua família, motivo pelo qual "jogadores de ponta" chegam à seleção brasileira mais prontos.
- Essa pressão tem uma parte negativa, mas tem outro lado. Quando chegam (à seleção brasileira) estão mais preparados. Por isso temos que tratá-los como homens.
O paternalismo, segundo o técnico da seleção brasileira, é um problema a ser combatido no futebol brasileiro. Segundo Dunga, jogadores brasileiros aceitam bem quando são substituídos ou quando viram reservas na Europa, mas apresentam "outro comportamento" quando isso acontece no Brasil.
- Será que é por falha dele ou por falha nossa ao tratar o jogador com certo paternalismo? O jogador reclama e vamos todos defender o jogador. Temos que refletir para o crescimento do futebol brasileiro. (...) Temos que rever nossos conceitos para continuar sendo competitivos e vencedores - disse Dunga.
Eu acho que o melhor caminho é esse: fazer os atletas acreditarem no que você está falando. Transmitir a experiência que você já tem."
Levir Culpi, sobre contato com jogadores
A seu lado, Levir Culpi assentia com a cabeça. O treinador do Fluminense compartiu a opinião sobre o trabalho de psicologia num time profissional e falou sobre os desafios extracampo que enfrenta na relação com os jogadores.
- (...) É como falar que vai trazer um psicólogo para resolver todos os problemas do seu time é uma mentira, porque os atletas brasileiros precisam de assistência social, de educação. O problema é muito sério. Vou citar um jogador de alto nível que trabalhou comigo. O padrasto ameaçava bater na irmã desse jogador, e ele ficava acordado, não dormia, não dorme até hoje. Como resolver isso no vestiário? Eu acho que o melhor caminho é esse: fazer os atletas acreditarem no que você está falando. Transmitir a experiência que você já tem. Eu sei que não consigo resolver um problema tão grande.
Antonio Conte, técnico da seleção italiana, não falou especificamente sobre o trabalho de psicologia, mas deu indicações de como faz para tentar tentar administrar os egos de seus jogadores.
- É difícil, porque eles são popstars. Você tem que se fazer entender em reuniões individuais ou coletivas, tem que passar o conceito do "nós", não do "eu". Na seleção isso é ainda mais importante. É um trabalho difícil, porque mexe com interesses pessoais, mas os jogadores têm mostrado compreensão.